A última castanha
Chegando o tempo, as castanhas amadurecem e caem por si.
Só que esta não caiu.
- Estou bem onde estou e não quero aventuras – dizia.
Uma a uma, as outras dos ramos iam caindo e rebolando pelo chão, protegidas pelo cobertor ouriçado que as cobria até ao nariz.
Nariz é modo de dizer…
A tímida e teimosa castanha desta história a tudo assistia do seu mirante e não gostava.
- A mim não me levam eles – dizia.
Era a única que sobrava em todo o castanheiro. As folhas a fugirem da árvore, sopradas pelo vento, e ela a afincar-se ao ramo, com unhas e dentes.
Unhas e dentes é um modo de dizer…
Sozinha, desabrigada, não estava feliz. Nem infeliz.
Sentia até uma ponta de orgulho por ter conseguido resistir tanto tempo.
Um sabor de vitória que a ouriçou toda.
- Ai que vou cair – gritou.
Mas, no último instante, conseguiu agarrar-se.
Ainda não era daquela.
Entardecia. Um grupo de gente acendera uma fogueira, junto ao castanheiro.
Os garotos, que tinham andado às castanhas, e os pais dos garotos e os amigos dos garotos riam e cantavam.
Estavam a preparar o magusto da noite de São Martinho.
A castanha solitária, no alto do castanheiro nu, estranhou a vizinhança. E intrigou-se.
Que estaria a passar-se?
Debruçou-se do ramo mais e mais. A madeira a arder estalava, mesmo por baixo da castanha, a última.
O fumo entontecia-a. E se fosse ver de perto o que se passava?
Foi. Caiu.
E a história acaba aqui.
Paciência.
É o destino das castanhas.
Destino é um modo de dizer…
Autor: António Torrado
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